ARTIGO: UM MAL CAUSADO PELO MODERNISMO. POR TOTA MAIA

Post Original: https://modulacao.wordpress.com/2017/01/16/um-mal-causado-pelo-modernismo-por-tota-maia/#more-1797

Quando eu tinha 15 anos sabia
desenhar como Rafael,
mas, precisei de uma vida inteira
para aprender a desenhar como as crianças.

Pablo Picasso.

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1Monumento a Vittorio Emanuele II, ou Altar da Pátria, ou bolo de noiva (de Giuseppe Secconi; começou a ser construído em 1895 e completado em 1935; 2. Villa Savoye (Charles-Edouard Jeanneret-Gris, vulgo Le Corbusier, projeto de 1928).Fonte:Wikipédia.

A arquitetura chamada “antiga”, baseada no classicismo romano e grego, possuía uma aura que elevava o artista-arquiteto – como também o objeto arquitetônico – a uma posição de respeito na sociedade, que o modernismo, de certa forma, reduziu.

É muito comum um “leigo” preferir a arquitetura antiga à moderna, ou contemporânea. Já comentei o assunto em um texto chamado “Em Defesa do Patrimônio Arquitetônico”: (http://www.iabpe.org.br/site/noticias-ler.php?id=539)ou (http://defender.org.br/artigos/em-defesa-do-patrimonio-arquitetonico-por-tota-maia/” … qualquer um poderia “executar” o conceito modernista, enquanto na arquitetura antiga, a complexidade de esculturas e adornos tornava praticamente impossível a “execução” por um leigo…Percebi a confusão, infelizmente comungada pela maioria, primeiramente ao atribuir à técnica (execução) “status” de essência principal e posteriormente ao confundir “valor histórico” com “valor artístico”. No primeiro caso, as questões de cunho estético (proporção, equilíbrio, cor, modulação, etc.) são relegadas a segundo plano, em detrimento da “perfeição” do resultado. Os valores mais importantes, aqueles que remetem à alma ou à reflexão do artista sobre a época em que se vive quase sempre não são assimiladas.”

Ao olhar desavisado, a simplicidade da estética moderna, em contrapartida a complexidade da “antiga”, faz com que, hoje, uma pessoa “qualquer “se sinta encorajada a executar um projeto de baixa “dificuldade”. De certa maneira, se assemelha ao conceito máximo da estética punk, dos meados dos anos setenta do século XX: Do it yourself!

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Imagem Fonte:  https: //www.google.com.br/url?sa=i&rct=j&q=&esrc=s&source=images&cd=&ved=0ahUKEwjvrdGKlq3QAhVED5AKHep2COkQjhwIBQ&url=https%3A%2F%2Fwww.vivareal.com.br%2Faluguel%2Frj%2Fararuama%2Fcasa_residencial%2F&bvm=bv.138493631,d.Y2I&psig=AFQjCNHlJu1QrT7HzIfUYLLOXSBSo2Db_A&ust=1479381524755081

A busca pela “limpeza formal” (retirada dos adornos) e pela aproximação com a área da engenharia ao explorar formalmente seus elementos ao invés de escondê-los – atribuídas ao modernismo – aproximou, para muitos, este “estilo”* à estética “feia”, ou sem estética, já que o “belo” pertence a antiguidade.

É muito difícil convencer um leigo que existe equilíbrio na assimetria; que reentrâncias e saliências, luz e sombras, ou a desconstrução da forma, podem ser mais interessantes que desenhos de volutas, capitéis, ou adornos quaisquer; que a rigidez plástica e espacial de uma modulação pode ser mais versátil, ou simplesmente não existir; que devemos esquecer janelas e portas e entendê-las como vazios, e paredes e lajes como cheios; que precisamos nos abstrair das duas dimensões: plantas e fachadas – tão somente representações – e nos atermos a espaços e volumes.
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Guangzhou Opera House (projeto de Zaha Hadid). Imagem fonte: http://www.b9.com.br/64214/arquitetura/as-grandes-obras-de-zaha-hadid/

É ainda mais difícil convencê-los que a arquitetura deve está relacionada ao seu tempo, e principalmente, a símbolos e sentimentos conectados ao que se ver, e não necessariamente ao seu uso ou sua função. Tenho uma amiga que visitou o Museu Judaico de Berlim (de autoria de Daneil Libeskind) e me fez o seguinte comentário:

– Estou chocada com a “esquisitice” do museu; ele é tão “troncho” e “deformado” que ao sair me deu repugnância!

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Outro fator importante seria a severidade compositiva clássica em contrapartida a liberdade moderna que conduz ao “tudo é permitido” **.

Juntando-se a ignorância cultural artístico-arquitetônica à preferência pelo antigo, mais à simplicidade construtiva e ao ”tudo pode” modernista, temos uma bomba: Hoje muita gente se acha arquiteto (“faça você mesmo, lembra?”).

Recentemente me aconteceu um fato que reflete tal situação; após explanar sobre as diversas fases de um projeto arquitetônico a um cliente (Estudo Preliminar, Ante-projeto, Projeto legal, Projeto executivo ,etc), ele me disse que somente gostaria de me “contratar” pela etapa do Projeto Legal, e isso porque a prefeitura exigia. Depois disparou a pérola:

– Você não poderia apenas “desenhar” a planta que fiz?


Tentei ver a ele, primeiramente a questão legal da coisa; que a prefeitura, bem como todos os órgãos públicos, exige a presença de um arquiteto porque existe uma porção de leis que o projeto tem que atender, e lhe mostrei algumas que baixei pela internet (Lei do Uso do solo de cada município, Código de obras, Lei de edificações e instalações, Legislação Ambiental, Normas de acessibilidade, Códigos e Normas dos Bombeiro, etc, etc).

– Mas “todo mundo” mora em uma casinha sem arquiteto e não precisa de nada disso, e eu só quero um projetinho para uma regularizaçãozinha!

(O diminutivo ajuda a ”minimizar” a importância do trabalho e, conseqüentemente, preço)

O que me admira era que o tal cliente não era uma pessoa ignorante ou de baixo poder aquisitivo.

– Que fique claro: quem vai “escolher” a fachada, o tipo de janela, e de telhado serei eu! Não quero aquelas coisas retas e sem graça; quero aquelas grades que possuem “curvas na parte superior”!

E então me mostrou algumas fotos retiradas de revistas.

Este tipo de cliente sabe muito bem o que está querendo, e, principalmente, o que não quer. Ele quer ser “chique”, e o arquiteto “moderno” não o ajuda a ser. E ele encontra nos objetos e materiais que imitam o passado o seu ideal estético, mesmo que, ao “nosso” olhar, de péssimo gosto e acabamento: torneiras, fechaduras, portas, grades de ferro e esquadrias em geral, luminárias, mobiliário, objetos de decoração, etc, etc.

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Nesta ótica, concluímos que o modernismo nos trouxe a simplificação da construção – com a lógica das repetições industriais e barateamento do custo da obra,  nova distribuição espacial e funcional que se adéqua a atualidade – mas não conseguiu “apagar” o apego a estética do passado. Por esta razão não é difícil encontrar no conjunto urbano exemplos de uma arquitetura vernacular híbrida; que possui funções, dimensionamentos, aspectos construtivos e alguns materiais de aparência e tecnologia contemporânea, mas detalhes e nuances que nos remetem a qualquer coisa que ligue a um elemento histórico qualquer.

Precisamos refletir e rever alguns paradigmas que nos impedem de concretizar possíveis possibilidades de trabalhos; ao olhar desse “nicho de mercado”, as decisões estéticas – algo mais próximo ao classicismo – saíram da responsabilidade do arquiteto, justamente a nossa maior “virtude” nas épocas anteriores: Eu quero que projetem aquilo que “não sei fazer!” Conheço diversos exemplos de “retro” em vários segmentos do design; porém desconheço algo minimamente agradável sobre o tema em arquitetura. A experiência Pós-modernista dos anos oitenta me parecia mais lúdica e com menos investigações plásticas do que encontramos em outras atividades do design. Pessoalmente não sei o caminho; mas talvez seja necessário rever a soberba, e procurar ir de encontro a uma linguagem nostálgica, sem ser pueril. Este é o desafio.

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Design retro futurista . Imagem Fonte:     http://obviousmag.org/archives/2011/04/imperia_gp_design_retro_futurista_e_tecnologia_consciente.html

* Poderia até ser tratado como uma heresia, chamar o modernismo de “estilo”. A sua proposta tem como premissa justamente “a falta de estilo”. Porém,  muitos leigos (e até estudiosos) entendem assim, e para simplificar a compreensão, comentemos tal pecado.

* “Tudo é permitido” no modernismo, apesar de inicialmente Le Corbusier ter decretado dos 5 dogmas : planta livre, fachada livre, pilotis, terraço jardim e janelas em fita).

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